terça-feira, abril 22, 2008

outra nietzscheana (ou pantera VI)



Outra nietzscheana
(Sebastião Uchoa Leite)

A tensa pantera
Não salta
Porque pensa
Assim Eros
Não dispensa
Agarra
O que à garra
Compensa


A uma incógnita (1991)


ps. tapa na pantera:
« a risada é sem dúvida o grande... radar »


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docência

« Há certamente uma pedagogia das matemáticas, uma didática das línguas vivas, há métodos adequados ao ensino das ciências, haverá técnicas úteis, procedimentos eficazes, regras a ter em conta. Mas... os resultados serão diferentes se se tratar de um professor exigente e genuinamente interessado pelos seus alunos ou de um professor descuidado do seu trabalho, desatento, detestado, troçado ou simplesmente desprezado. O método mais correto não salvará um professor que não saiba obter a amizade e o respeito dos seus alunos. O método mais arcaico fará maravilhas nas mãos de um professor estimado, que ensina de forma rica, entusiástica e apaixonada aquilo que ama, que se interessa verdadeiramente pelo saber que ministra, pelos alunos que lhe foram confiados, pelo modo como vivem e sentem e pensam o mundo que os rodeia e que, mesmo inexperiente ou ignorante das sofisticadas regras didácticas aconselhadas para o ensino da sua disciplina, saiba estabalecer com os seus alunos esse parentesco insondável e dialógico que constitui o segredo de todos os magistérios.
(...) Há um isomorfismo fundamental entre o professor e os seus alunos que faz com que, mais do que aquilo que sabe ou julga saber, cada professor ensina sobretudo aquilo que é.
No entanto, "aquilo que se é" não é um puro dado, mas uma tarefa. "Aquilo que se é" é aquilo que é necessário ser, que importa construir. Não se trata pois —e este é para nós um ponto de capital importância— de fazer o elogio de uma qualquer espontaneidade bem intencionada mas impreparada e inculta, de uma inocente autenticidade ou de uma universal sociabilidade, mas de resgatar, para o professor, o direito e o dever de ser exigente para consigo mesmo, para com a sua profissão, para com os seus alunos e para com o saber que, face a eles, representa, incarna e deve actualizar.
Para lá e através de tudo o que é dito, o que passa fundamentalmente para os alunos é a figura humana, a presença concreta do professor, o modo como com eles se relaciona, como se interessa pelos seus interesses, o modo como vive e cultiva a sua profissão, o modo como se situa face ao saber que ministra, a paixão que o anima. »

Olga Pombo, A escola, a recta e o círculo

a pantera (V)




« A pantera africana é como uma leoa (...). Sua beleza deleita os animais, que sempre andariam ao seu redor, não fosse seu olhar terrível. A pantera, que não ignora essa circunstância, baixa os olhos; os animais aproximam-se para gozar com tanta formosura, e ela agarra o que está mais próximo e o devora. »

Leonardo da Vinci apud Jorge Luis Borges, El Libro de los Seres Imaginarios

la pantera (IV)



« En los bestiarios medievales, la palabra pantera indica un animal asaz diferente del "mamífero carnicero" de la zoología contemporánea. Aristóteles había mencionado que su olor atrae a los demás animales; Eliano —autor latino apodado Lengua de Miel por su cabal dominio del griego— declaró que ese olor también era agradable a los hombres. (En este rasgo, algunos han conjeturado una confusión con el gato de algalia.) Plinio le atribuyó una mancha en el lomo, de forma circular, que menguaba y crecía con la luna. A estas circunstancias maravillosas vino a agregarse el hecho de que la Biblia griega de los Stenta usa la palabra pantera en un lugar que puede referirse a Jesús (Oseas 5:14).

En el bestiario anglosajón del códice de Exeter, la pantera es un animal solitario y suave, de melodiosa voz y aliento fragante. Hace su habitación en las montañas, en lugar secreto. No tiene otro enemigo que el dragón, con el que sin tregua combate. Duerme tres noches y, cuando se despierta cantando, multitudes de hombres y de animales acuden a su cueva, desde los campos, los castillos y las ciudades, atraídos por la fragancia y la música. (...) »


Jorge Luis Borges, El Libro de los Seres Imaginarios
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domingo, abril 20, 2008

samba do materialismo histórico



Para cantar com esta melodia , de Bubu e Jamelão!

O materialismo histórico é o herdeiro da filosofia clássica alemã
(Carlos Nelson Coutinho/ Leandro Konder/ Bubu/ Jamelão)

Quando veio a burguesia
O velho Kant se pôs a filosofar
E chegou um belo dia a elaborar
O seu idealismo racional
Onde a gnosiologia não juntava com a moral
Mesmo sendo uma tremenda antinomia
Fez-se um progresso na filosofia

Hegel foi quem resolveu
Esse problema, unindo a lógica e a história
Numa grande ontologia
Que foi sua glória
Ao seu idealismo genial
Dinâmico e totalizante
Mais profundo que o de Kant
Só faltava a dimensão materialista
Que lhe daria a práxis marxista.

O proletariado não quer
Perder de vista a lição
Da experiência
Do idealismo clássico alemão

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a pantera (III)



« a Besta que vi era como uma pantera »
(Apocalipse 13)



« Tourner and Lewton crafted in the low-budget Cat People an eerie and evocative story of female sexuality as lethal threat, generating chills while leaving virtually everything off-screen. »
James Kendrik's review of Schrader's Cat People



« Some have the read Cat People as being blatantly misogynistic, particularly in the way it subdues the threatening aspects of Irena's sexuality and asserts absolute male control at the end. From a certain perspective, this is an entirely valid reading, especially when compared to the sexual ideology at work in the original. Schrader insists on reading the film as an allusion to Dante and Beatrice� with Oliver's Dante pursuing the unattainable Irena's Beatrice�, and while such an understanding of the material turns the ending into a moment of enshrinement, it is hard to get away from the fact that Irena's final shrine is literally a cage. »
James Kendrik's review of Schrader's Cat People



Depois que descansei o corpo lasso,
recomecei pelo plaino deserto,
pé firme em baixo, mas incerto o passo;

e quando o fim da estrada estava perto,
um leopardo ligeiro, de repente,
que de pele manchada era coberto,

surgiu e se postou na minha frente,
e com tal vulto encheu o meu caminho
que só “voltar”volteava em minha mente.

(Do Canto I do Inferno de Dante. Trad. de Augusto de Campos)

mojica's heavens gate (FSP 20/04/08)



FOLHA: Quando criança, o sr. teve experiências místicas, sobrenaturais?
MOJICA -
Sim, algumas. Eu fui criado nos fundos de um cinema. Quando tinha três anos e meio (!!!), o projetista me levou à sala. Estava passando um filme pornô de lésbicas. A primeira cena de cinema que vi foi a de uma vagina aberta... Até hoje tenho tentado reconstruir essa cena em algum filme meu, mas ainda não consegui...

Será que o Zé viu Hable com ella?




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segunda-feira, abril 14, 2008

oleanna



So here we go again... Mais uma vez assisto Oleanna com os alunos. Segundo o IMDB, "He said it was a lesson. She said it was sexual harassment. Whichever side you take, you're wrong." Mas a gente poderia dizer também: "Whichever side you take, you're right!" Os dois atores são excelentes, mas Debra Eisenstadt é simplesmente perfeita no papel de Carol.



and here it goes Mamet:

« CAROL: What gives you the right. Yes. To speak to a woman in your private... Yes. Yes. I'm sorry. I'm sorry. You feel yourself empowered... you say so yourself. To strut. To posture. To "perform." To "Call me in here..." Eh? You say that higher education is a joke. And treat it as such, you treat it as such. And confess to a taste to play the Patriarch in your class. To grant this. To deny that. To embrace your students.
(...)
How can you deny it. You did it to me. Here. You did... You confess. You love the Power. To deviate. To invent, to transgress... to transgress whatever norms have been established for us. And you think it's charming to "question" in yourself this taste to mock and destroy. But you should question it. Professor. And you pick those things which you feel advance you: publication, tenure, and the steps to get them you call "harmless rituals." And you perform those steps. Although you say it is hypocrisy. But to the aspirations of your students. Of hardworking students, who come here, who slave to come here —you have no idea what it cost me to come to this school— you mock us. You call education "hazing," and from your so-protected, so-elitist seat you hold our confusion as a joke, and our hopes and efforts with it. Then you sit there and say "what have I done?" »
® Vintage Books, NY, 1993.
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domingo, abril 06, 2008

LES DEVENIRS REVOLUTIONAIRES!!!



VIVE LA RÉVOLUTION!!!



Poemeto catártico
Eduardo Coutinho

Quando os tronos vierem por terra
E o dinheiro valer mais nada
Ainda lhe restará um trono, burguês
E este será sua privada.

Tendo, assim, no lixo da história
Sua podridão acumulada,
Vossa excelência será, finalmente
De sua propriedade, privada.

E o pior dos castigos seus,
Quando forem suas leis rasgadas,
Não será guilhotina ou pau-de-arara, burguês
Será limpar a própria privada.


(Rio, abril de 2008)

cliquez ici pour voir un video sur la manifestion étudiante de Mai 68





des images! des images! calmez vous, monsieur!




e alguém aí sabe russo?!




come ananás, mastiga perdiz,
teu dia está prestes, burguês.




onde? quando? donez moi les coordonnées!

sábado, abril 05, 2008

a pantera (II)




A Pantera
Rainer Maria Rilke (trad.Augusto de Campos)

(No Jardin des Plantes, Paris)

De tanto olhar as grades seu olhar
esmoreceu e nada mais aferra.
Como se houvesse só grades na terra:
grades, apenas grades para olhar.

A onda andante e flexível do seu vulto
em círculos concêntricos decresce,
dança de força em torno a um ponto oculto
no qual um grande impulso se arrefece.

De vez em quando o fecho da pupila
se abre em silêncio. Uma imagem, então,
na tensa paz dos músculos se instila
para morrer no coração.



Metáfora do desejo: a fera que assim mesmo avança, ataca, devora... Você renuncia à noite, recitando Rilke: "tudo aquilo em que ponho afeto fica mais forte e me devora"; consegue enfim « The curse of the cat people » para ver sozinho com seu gato no colo, ronronando inocente!

sexta-feira, abril 04, 2008

la collectionneuse



"le bonheur sans nuage, quelle tristesse"
Haydée Politoff em la collectionneuse de Eric Rohmer


et avec monsieur Gainsbourg

Ah ! Si vous connaissiez ma poule
[Maurice Chevalier]
Paroles: Albert Willemetz, René Toche. Musique: Charles Borel-Clerc 1938

De Rochechouart jusqu'à Ménilmuche
De la rue de Lappe à la rue de la Gaité
Y a pas un seul même dans tout Pantruche
Qui avec la mienne pourrait lutter
De la tête aux pieds quand on l'épluche
On ne trouve rien à lui reprocher
C'est un oiseau rare
Que roi des veinards
J'ai eu le bonheur de dénicher :

Ah ! Si vous connaissiez ma poule
Vous en perdriez tous la boule
Ses petits seins pervers
Qui pointent au travers
De son pull-over
Vous mettent la tête à l'envers !
Elle a des jambes faites au moule
Des cheveux fous, frisés partout
Et tout et tout
Si vous la voyiez
Vous en rêveriez !
Ah ! Si vous connaissiez ma poule

Bien qu'elle s'habille au Prisunic
Pas une ne saurait la dégoter
Elle dame le pion, elle fait la nique
Aux plus fameuses reines de beauté
La miss France et la miss Amérique
Sont de la crotte de bique à côté
Sans diam' et sans clips
Elle vous éclipse
Toutes les stars les plus réputées.

Ah ! Si vous connaissiez ma poule
Vous en perdriez tous la boule
Marlène et Darrieux
N'arrivent qu'en deux
La Greta Garbo
Peut même retirer son chapeau !
Ils n'en n'ont pas à Liverpool
A New-York, à Honolulu
De mieux foutue
Si vous la voyiez
Vous en rêveriez !
Ah ! Si vous connaissiez ma poule.

Marguerite de Bourgogne auprès d'elle
N'avait que nib comme tempérament
Il faut l'entendre quand elle appelle
Son petit Momo au grand moment
Son corps frissonne d'un façon telle
Que la maison tremble également
Et ça vous explique
Les secousses sismiques
Dont les journaux parlaient récemment.

Ah ! Si vous connaissiez ma poule,
Vous en perdriez tous la boule
Ses baisers moëlleux
Font dresser les cheveux
Ses baisers profonds
Vous font sauter jusqu'au plafond !
Si vous saviez comme elle roucoule
On l'entend jusqu'au fond de Passy
Crier : "Chéri !"
Si vous la voyiez
Vous me la chiperiez !
Mais... vous ne connaîtrez pas ma poule.

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terça-feira, abril 01, 2008

Deus (parte II)



« No passado, você suportava mal o exibicionismo pretensioso de Keith, soltando grunhidos de euforia e cantarolando em falsetto a melodia de Concerto de Colônia ao fundo. "pode ser doença, e doença pega. Se já não pegou...", você diz para você mesmo agora em tom de autocrítica, à espera do esperado.
"Cada um inventa a sua marca registrada", um colega americano te disse há algum tempo, para esfriar a sua reação negativa ao estilo do pianista, acrescentando que não havia um só crítico de jazz que tivesse deixado o detalhe sem comentário. Para elogiar ou para esculhambar o pianista. Ele ainda te explicou que no show business americano é esssencial o toque de originalidade para alcançar o grande sucesso. Também fazem parte do espetáculo de Keith as piruetas no banquinho e a cabeça baixa contra o piano, o que lhe custa dores tremendas nas costas e gastos piores com médicos.
...Keith Jarrett não podia ser simplesmente um Thelonious Monk a menos, um Art Tatum ou um Bill Evans a mais.»
Silviano Santiago. Keith Jarrett no Blue Note (Improvisos de Jazz)

As idiossincrasias performáticas de Keith Jarrett não são puro folclore, que nada acrescentam à sua música; é impossível separar as duas coisas. Grunhidos e esbarrões no piano são sons "intencionalmente" acrescentados às notas musicais. Intriga, na narrativa de Santiago, a "espera do esperado", que pode significar duas coisas bem distintas: ceder a toda essa ambiência da música de Jarrett, com soluções aparentemente romântico-previsíveis; ou bem o contrário disso: dar-se conta de que a "euforia" de suas "soluções românticas" é a superfície de uma explosão sonora, sobretudo harmônica e estilística, extremamente arriscada.

(...)